O palco, o pêndulo e a pressa.

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“Eu mal entrei em mim e assustada já quero sair. Eu descubro que estou além da voracidade. Sou um ímpeto partido no meio.” (Um Sopro de Vida, Clarice Lispector)

De repente, já é novembro. Dezembro quando esse texto for publicado, provavelmente. E assim, de repente mesmo, meu primeiro e último texto nesse canal foi num tão distante agosto. Amigos me perguntaram “E aquele seu site de textos, ein?”. A passagem do tempo é imperiosa e brutal. Quero retomar minha tentativa de hobbie. Eis a perspectiva do que gostaria de expor sobre meus últimos meses: descobri um pecado fatal do artista. Nós que nos levamos tão a sério, criamos um apreço por aquilo que escrevemos e colocamos para o mundo. Sempre senti um forte apego à ideia de ter um site para publicar o que escrevo. Esse carinho intenso se metamorfiza em armadilha diante dos nossos olhos. Me pego sempre deixando o projeto numa estante mais alta, um pedestal inalcançável de perfeição, afinal, se gosto tanto, tem de ser especial, não? Bem, a verdade é que não existirá versão boa de textos meus sem que eu me permita experimentar. Errar. Escrever asneiras e mesmo assim pô-las em outdoors. É profundamente difícil me permitir ao fracasso. Mas é o processo natural das coisas. Partindo disso, quero dizer que escrevi, sim, bastante no tempo que separa agosto de agora. E tentando não racionalizar demais a coisa, escolhi digitar tudo que encontrei de digno no papel, e trazer pra cá mais da bagunça que é parte indissociável de mim, goste eu ou não.

Descobri outras coisas nessa primavera também, está tudo esparramado entre as linhas que adicionarei ao site. Aprendi sobre a pressa e seu chicote impiedoso. Sobre os caminhos tortuosos do desencontro. Sobre essa minha secreta megalomania que infecta tudo que escrevo – e uma lucidez literal nessa loucura da qual me esqueço de vez em quando. No fim, é tudo sempre sobre o vai-e-vem das ondas. Eterno, incansável e inconstante.

Me derramo, portanto, aqui. Em vãs tentativas insanas de achar “eu” no meio do meu eloquente discurso.

Há uma riqueza na memória que foi estelarmente capturada no filme “Ainda Estou Aqui” de Walter Salles. A recordação é chave para a ternura com que olhamos para a vida. Nostalgia, palavra-poema. Me ver perdido e me encontrando em passagens de meus diários desse ano ainda é, de certa forma, parte dessa grande lição que enfrento: um caminho de voltar para mim. Me externalizo muito. Ando por aí numa espécie de esquizofrenia cacofônica que me exaure a alma. Sou eu “eu-mesmo”, mas também sou eu “eu-que-me-julga” o tempo todo. Isso transborda em cada passagem que trago para cá.

É bom poder olhar pra trás e me entender melhor. Não haveria outro jeito de chegar aqui, não fosse assim, da forma como foi. Daí a imagem do pêndulo. Às vezes estamos no passado, canto de lá do pêndulo, desorientados, com pressa de sair do buraco. Outras, estamos do lado de cá, olhando pra trás, fazendo sentido do que parecia ser insuperável. O palco deixo como segredo. Pra mim, é tudo sobre o palco, mas isso é matéria subjetiva do que escrevo – um farol cujo feixe de luz é contundente. Nem tudo precisa ser inteligível à primeira vista.

O que posso dizer. Sou só um, demando de mim o trabalho de uma equipe inteira. Sou meu pior chefe. Mas (me) prometo que, pouco a pouco, as coisas encontrarão seu sentido por aqui. Prometo que meus textos são sempre preparados com incontáveis camadas. Deixo rastros por todo lugar que passo, porque quero que me encontrem. E nenhuma outra estrada desemboca direto em meu espírito como a das palavras com que faço as migalhas.

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